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Retomar confiança é primeiro desafio do próximo governo
27/10/2014
O próximo mandato da Presidência da República terá uma série de desafios econômicos durante os quatro anos no poder, os quais exigirão mudanças no atual modelo, segundo especialistas entrevistados pelo DCI.
Os economistas são unânimes em afirmar que a prioridade é a retomada da confiança tanto do consumidor, quanto do empresário nacional e até estrangeiro. Mas divergem das formas como se atingir esse objetivo. De qualquer modo, eles comentam que se algo for feito a conclusão será o aumento de investimentos necessários para alavancar o Produto Interno Bruto (PIB).
"Trazer a confiança de volta é um dos anseios da sociedade. O mercado precisa saber o que produzir, como e para quem produzir", entende o professor Manuel Enriquez Garcia, presidente da Ordem dos Economistas do Brasil (OEB) e do Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP).
Na visão do economista Eduardo Bassin, da Bassin Consultoria, e de Andrew Storfer, diretor de economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) um modo de ser fazer isso seria retomar o chamado tripé macroeconômico - cumprimento das metas de inflação e as fiscais, e manter o câmbio flutuante.
Novas questões
Para o professor Garcia, o tripé macroeconômico foi importante para garantir a estabilidade econômica, mas "o Brasil precisa de um projeto de crescimento econômico". "Estamos sempre indo atrás de resolver problemas pontual- mente. Ora focamos na inflação, ora na taxa de câmbio. Precisamos de um projeto nos moldes do PAEG [plano de ação econômica do governo], que vise tornar os setores mais eficientes e competitivos, aumentar investimentos [privados], visando também a questão do sistema tributário. E isso tem que ser divulgado o quanto antes", aponta.
O PAEG foi criado após o Golpe Militar de 1964, e tinha como objetivos combater a inflação; aumentar os investimentos estatais - principalmente em infraestrutura - e externos; reformar o sistema financeiro nacional; diminuir as desigualdades regionais.
O consultor e mestre em finanças públicas, Raul Velloso, endossa a opinião de que deve ter um projeto para o crescimento, mas que em vez de focar no consumo, como foi conduzido até então, seja focado nos investimentos. "No primeiro dia útil de 2015, o governo já deveria informar o novo modelo adotado. De modo que aponte a lista de problemas que serão priorizadas. E em minha opinião, o ponto principal é aumentar investimentos privados na infraestrutura e, nisso, as prioridades seriam ajudar o setor elétrico e o de transportes", aponta o especialista.
Bassin entende que além de retomar o "tripé" e atrair investimentos privados, uma medida que pode ser feita mais no curto prazo seria aumentar a taxa básica de juros (Selic) em no máximo um ponto percentual - atualmente está em 11% ao ano. "A inflação de hoje, não é só por produtos, mas também por serviços. E não digo que é voltar a patamares de 40%, como ocorreu no governo de Fernando Henrique Cardoso, já muito noticiado, mas apenas um ponto", explica o economista.
Contudo, para ele questões mais de longo prazo, como a reforma tributária e educação, também não podem deixar de ser contempladas no próximo governo federal.
Andrew Storfer reconhece retomar o "tripé" que será uma prática difícil, já que no segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva e o atual, de Dilma Rousseff, sinalizaram aceitar uma inflação mais alta, visando o crescimento econômico, "o que não ocorreu". "Por isso qualquer sinalização de mudança será importante", diz.
Herança
De acordo com Velloso, tantos desafios são colocados em vista do cenário atual, com algumas situações que não ocorriam desde 2002. "A herança econômica será resultado de seis desarranjos. O primeiro deles é a queda ou estagnação da taxa global de investimentos do País, isto é a relação entre investimento e PIB. A segunda delas é a estagnação ou queda da produção industrial. O terceiro ponto, levado por esses dois primeiros, é a queda no crescimento sustentável do PIB para algo em torno de 0% a 1%", ilustra.
Ainda segundo ele, os outros "desarranjos" são o crescimento menor do setor de serviços, "que lidera a economia", e inflação acima do teto da meta, de 6,5%. "Há também o desajuste da balança de pagamentos, ou seja, a piora das contas externas e, como há muito não se via o déficit primário. E tudo isso sem que haja uma crise externa, como antes era a influência."
Riscos
Raul Velloso comenta ainda que se nada for feito o capítulo final do País deverá ser a perda do grau de investimento pelas agências de classificação de risco. "E se isso acontecer, Estados Unidos, por exemplo, parará de direcionar recursos ao Brasil, já que pelas regras locais, o país precisa ter investiment grade [grau de investimento, em inglês]", alerta.
Por meio de nota, a Fitch Ratings informou que, a partir de hoje, irá monitorar a estratégia do próximo governo para impulsionar o crescimento e corrigir alguns desequilíbrios macro que surgiram nos últimos anos.
"A próxima administração herdará uma economia que enfrenta múltiplos desafios em termos de baixo crescimento, inflação elevada e desempenho fiscal em deterioração. Desta forma, os ajustes nas políticas serão cruciais para determinar a trajetória futura do rating soberano e de sua perspectiva", afirmou Shelly Shetty, diretora responsável pelo grupo de análise soberana da Fitch na América Latina, na nota.
